Detentora de um dos catálogos mais vastos da história do cinema, há alguns anos já a Disney tenta se inserir no lucrativo negócio da nostalgia contemporânea através de refilmagens de suas animações mais clássicas em “live-action”. Este “live-action” consiste predominantemente em computação gráfica e tem gerado resultados conflitantes que variam do tedioso ao verdadeiramente perturbador mas, por enquanto, ainda não produziu algo a altura de suas histórias originais. É possível que este histórico de insucessos esteja prestes a mudar com A Pequena Sereia, que estreia nos cinemas brasileiros nesta quinta-feira (25).
A Pequena Sereia é baseado na animação de 1989, que por sua vez foi inspirada no traumatizante conto homônimo de Hans Christian Andersen. A versão de 2023 acompanha a sereia Ariel (Halle Bailey), filha mais nova do Rei Tritão (Javier Bardem), soberano dos sete mares. Ariel é uma jovem fascinada pelo mundo da superfície e se apaixona pelo príncipe Eric (Jonah Hauer-King) depois de salvá-lo de um naufrágio. Para viver este amor, Ariel entra em um contrato com a bruxa do mar Úrsula (Melissa McCarthy): em troca de sua magnifica voz, ela ganha pernas. Porém, a bruxa impõe condições ao contrato. Até o anoitecer de seu terceiro dia em terra, Ariel deve beijar o príncipe ou enfrentar consequências terríveis. A sereia, auxiliada por seus amigos Sebastião (Daveed Diggs), Linguado (Jacob Tremblay) e Sabidão (Awkwafina) precisa correr contra o tempo para salvar mar e terra dos tentáculos de Úrsula. A direção é de Rob Marshall, com roteiro de Jane Goldman e David Magee.
Esta versão consegue acertar onde seus antecessores falharam ao transpor, em partes, a magia da animação original para o live-action. Em partes porque, na tentativa de criar um universo realista, muito se perde. A maior vítima é o pobre Linguado, cuja aparência lembra a de um peixe esquecido no freezer por mais tempo que o recomendado. Outro golpe duro é desferido no desenvolvimento da protagonista: o fundo do mar é um lugar mais belo e fascinante que qualquer local mostrado na superfície. É difícil compreender a fascinação de Ariel com quinquilharias humanas quando ela tem a sua disposição cores e sereias.
O roteiro é duplamente vitimado aqui, já que o tempo demonstra que a história original, quando separada da animação, envelheceu como vinagre. A avassaladora paixão de Ariel por Eric é um tanto quanto constrangedora para as audiências mais maduras, justamente aquelas impactadas pelo fator nostalgia. Porém, o filme conserva uma qualidade ingênua que pode atrair audiências mais jovens.
Apresentando uma atriz negra no papel principal, A Pequena Sereia tem um elenco diverso e se ancora fortemente na pauta do pertencimento, já que a história parece se passar em um mundo daltônico, cujo realismo se limita à aparência. Aqui percebemos novamente a atrativa ingenuidade da trama. Ariel fugiria aterrorizada se presenciasse os horrores que se encerravam nos porões de navios mercadores.
A Pequena Sereia renova a trilha sonora clássica da animação e oferece boas atuações, com destaque para Melissa McCarthy. Apesar de ainda não conter os elementos necessários para se inserir no panteão dos clássicos da Disney, é a tentativa mais bem-sucedida até aqui, é uma divertida forma de passar 2h15min de vida.
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